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Arrendamento rural na reforma tributária: O que todo proprietário e arrendatário precisa saber

Novas regras de IBS e CBS no arrendamento aumentam custos, exigem planejamento e mudam a gestão do negócio rural


A reforma tributária está chegando e, com ela, novas regras que prometem impactar diretamente o agronegócio. Se você é proprietário de terras arrendadas ou produtor rural, é fundamental entender como o IBS - Imposto sobre Bens e Serviços e a CBS - Contribuição sobre Bens e Serviços vão influenciar o seu negócio - e, consequentemente, o seu bolso.


A mudança não afeta apenas o dono da terra; ela pode significar um aumento no custo do arrendamento para o produtor, pois a tendência é que este novo imposto seja repassado no valor do contrato.


O cenário atual: De onde estamos saindo?


Para entender o tamanho da mudança, é preciso olhar para a distinção fundamental que a lei faz hoje entre arrendamento e parceria, dois contratos previstos no Estatuto da Terra, mas com tratamentos fiscais completamente distintos.


O arrendamento é visto pela legislação como um simples "aluguel". Para a pessoa física, que representa a esmagadora maioria dos proprietários de terras, o valor recebido vai direto para a declaração de IRPF - Imposto de Renda. A tributação ocorre conforme uma tabela progressiva que pode chegar a 27,5%, incidente sobre a receita bruta, sem a possibilidade de dedução de custos ou despesas da atividade rural.


Já a parceria agrícola é tratada como atividade rural para ambas as partes. Seus resultados são apurados no livro-caixa, onde as receitas são confrontadas com as despesas, e o imposto incide sobre o resultado líquido. Note que, no regime tributário atual, a preocupação do arrendador pessoa física é apenas com o IRPF.


Nos últimos anos, em grandes polos do agronegócio como o sudoeste de Goiás, por exemplo, acompanhamos uma forte tendência de transferência dessas terras para empresas (Holdings Rurais) como forma de planejamento sucessório. Mas mesmo na pessoa jurídica, a diferença de custo é gritante. Uma empresa no lucro presumido que recebe por arrendamento tem um custo fiscal de até 14,53%, enquanto na parceria esse custo cai para até 6,73%.


Essa diferença brutal leva muitos proprietários a "maquiar" o contrato de arrendamento como parceria para pagar menos tributos. A prática ficou mais tentadora após mudanças no Estatuto da Terra em 2007, que permitiram adiantamentos fixos na parceria, tornando-a parecida com um aluguel.


Contudo, com a eficiência da fiscalização da Receita Federal, que cruza dados de notas fiscais, georreferenc4iamento e movimentações financeiras, essa prática está cada vez mais arriscada. Defender-se de uma autuação por simulação de negócio jurídico é um desafio considerável.


A tabela abaixo ilustra a carga tributária atual sobre uma receita anual de R$ 1 milhão, mostrando a grande diferença entre os regimes.


Perfil do Proprietário

Receita anual do arrendamento

PIS(R$)

COFINS(R$)

IR / IRPJ + CSLL(R$)

Total Tributos do Arrendamento(R$)

Carga Efetiva

PF - Pessoa Física

R$1.000.000,00

0

0

275.000(IRPF 27,5% - teto ilustrativo)

275.000

27,50%

Pessoa Jurídica - Lucro Presumido

R$1.000.000,00

6.500(0,65%)

30.000(3,00%)

84.800(IRPJ 5,60% * CSLL 2,88%)

121.300

12,13%

Pessoa Jurídica - Lucro Real

R$1.000.000,00

16.500(1,65%)

76.000(7,6%)

340.00(34% s/ lucro ~ receita)

432.500

43,25%


Leitura rápida do cenário atual:


  • Pessoa física: Paga apenas IRPF (até 27,5%), sem PIS/COFINS sobre o aluguel;

  • Lucro presumido: A carga total se aproxima de 12,13% (podendo chegar a 14,53% em faturamentos muito altos);

  • Lucro real: No pior cenário (lucro igual à receita), a carga chega a 43,25%, mas diminui se houver custos dedutíveis.


A nova regra: Entendendo o IBS e a CBS no arrendamento


A partir de 2026, os valores recebidos pelo arrendamento rural estarão sujeitos aos novos tributos chamados IBS e CBS. Isso significa que, além do Imposto de Renda que você já paga (IRPF ou IRPJ/CSLL), pode ser necessário pagar também esses novos impostos.


Quem precisará pagar o IBS e a CBS?


Para as pessoas jurídicas (como holdings rurais), o enquadramento como contribuinte do IBS/CBS será inevitável.


Se você tem uma propriedade rural registrada como pessoa jurídica (por exemplo, uma holding rural), automaticamente será contribuinte do IBS e CBS.


Já para o proprietário pessoa física, será contribuinte desses impostos apenas quem cumprir, ao mesmo tempo, estas duas condições no ano anterior:


  • Receber mais de R$ 240 mil por ano com arrendamentos (valor que será corrigido);

  • Ter arrendado mais de 3 imóveis diferentes.


Na minha concepção, se você não preenche os dois requisitos ao mesmo tempo, você não pagará IBS/CBS sobre o arrendamento. Basta estar abaixo de um dos limites para garantir a isenção.


Controvérsia sobre a regra do excesso de 20% do limite anual (R$240 mil)


Atualmente, há dúvidas sobre como interpretar o art. 251 da LC 214/25. Alguns especialistas dizem que qualquer pessoa física que ultrapasse o limite anual em mais de 20% (acima de R$ 288 mil) já teria que pagar esses impostos imediatamente, mesmo que tenha poucos imóveis arrendados (até três).


Eu defendo que a interpretação correta é aquela que só obriga a pagar os impostos imediatamente quem já tem mais de três imóveis arrendados e ultrapassa o limite. Essa visão evita que o proprietário de poucos imóveis e que não tenha organização empresarial pague imposto como se fosse uma empresa imobiliária.


Dica: acompanhar com atenção a regulamentação da LC 214/25 e identificar qual interpretação será adotada.


Exemplos práticos:


  • João (não paga): Arrenda 2 propriedades e recebe R$ 200 mil por ano. Não paga IBS e CBS porque não atingiu nenhum dos dois critérios;

  • Maria (paga): Arrenda 4 propriedades e recebe R$ 300 mil por ano. Paga IBS e CBS, pois supera ambos os critérios;

  • Carlos (não paga): Arrenda 1 propriedade e recebe R$ 300 mil por ano. Não paga IBS e CBS porque, apesar de ter renda alta, não atende o requisito de mais de 3 imóveis;

  • Pedro (dúvida): Arrenda 2 propriedades e recebe R$ 290 mil no mesmo ano. Pela interpretação literal, deveria pagar IBS e CBS imediatamente, pois passou o limite de 20%. Pela interpretação sistemática que defendo, ele não pagaria, já que não atende o requisito de mais de 3 imóveis.


A questão controversa das múltiplas matrículas


Aqui surge uma zona cinzenta: o que são "imóveis diferentes"? A legislação ainda não define isso explicitamente, delegando a definição para um regulamento futuro. Isso abre espaço para duas interpretações:


  1. Interpretação registral: Cada matrícula equivale a um imóvel distinto.

  2. Interpretação econômica: Considera a unidade de exploração, conceito já consolidado no Estatuto da Terra (uma fazenda com 4 matrículas, mas operada como unidade única, seria 1 imóvel).


Na minha visão, a tese a ser adotada é a da "unidade econômica", como já ocorre para fins de ITR. No entanto, caso o regulamento não esclareça o ponto, uma estratégia preventiva seria unificar as matrículas.


Entendendo o cálculo e o impacto financeiro


Alíquota reduzida


O arrendamento rural terá uma alíquota de IBS/CBS reduzida em 70% em relação à alíquota de referência.


  • Exemplo: Se a alíquota geral for de 26,5%, a do arrendamento será de apenas 7,95%;

  • Num arrendamento de R$ 1.000.000,00, o IBS/CBS a ser pago será de R$ 79.500,00.


Crédito para arrendatários


O produtor rural (arrendatário) poderá usar o IBS/CBS pago no arrendamento como crédito, abatendo-o do imposto devido na venda de sua produção. No exemplo acima, ele teria um crédito de R$ 79.500,00 para reduzir os impostos de sua colheita.


Para aproveitar esse crédito sem dor de cabeça, o arrendatário deve:


  • Verificar se o arrendador é, de fato, contribuinte do IBS/CBS (caso contrário, não haverá crédito);

  • Inserir cláusulas de proteção no contrato para cobrir perdas de crédito por irregularidades do arrendador;

  • Exigir a emissão da nota fiscal da operação, uma novidade no processo.


A seguir, uma projeção da nova carga tributária, considerando o IBS/CBS de 7,95%.


Perfil do Proprietário

Receita Anual do Arrendamento(R$)

IBS/CBS(7,95%)(R$)

IR / IRPJ + CSLL(R$)

Total Tributos do arrendamento(R$)

Carga Efetiva(%)

Carga Máxima(%)

PF - Pessoa Física

1.000.000,00

79.50

275.000(IRPF a 27,5% - Teto ilustrtivo)

354.500

35,45%

35,45%

Pessoa Jurídica - Lucro Presumido

1.000.000,00

79.50

84.800(IRPJ + CSLL = 8,48%)

164.300

16,43%

18,83%

Pessoa Jurídica - Lucro Real

1.000.000,00

79.50

340.000(34% s/ lucro assumido ~ receita)

419.500

41,95%

41,95%


O que fazer agora: Um checklist para proprietários


Para proprietários com múltiplas matrículas


  • Avalie a unificação das matrículas como medida preventiva, com o suporte de um especialista jurídico;

  • Considere uma reorganização patrimonial antes da entrada em vigor das novas regras


Para proprietários com alta receita em poucos iImóveis


  • Acompanhe de perto a regulamentação complementar da LC 214/25 para verificar qual interpretação será adotada pelos órgãos tributários e evitar riscos futuros.


Para todos os proprietários


  • Faça um diagnóstico tributário ainda em 2025 para analisar se seu perfil se enquadra na regra de tributação;

  • Reavalie estratégias de planejamento sucessório e holdings familiares sob a nova ótica;

  • Prepare-se para as novas obrigações acessórias, como emissão de notas e entrega de declarações.


Análise do impacto prático


Impacto no fluxo de caixa


Haverá um descasamento financeiro significativo. O dono da terra recolhe e paga os 7,95% de IBS/CBS ao governo logo após receber o arrendamento. Para ele, a saída de caixa é imediata. Já o arrendatário só recupera esse valor como crédito quando vender sua produção, o que pode levar meses. Na prática, a cadeia produtiva estará "emprestando" dinheiro para o governo a custo zero, exigindo um planejamento de capital de giro mais apurado.


Repasse do custo e renegociação de contratos


O IBS/CBS é um custo tributário direto para o dono da terra, que não possui uma cadeia de insumos para gerar créditos de compensação. Portanto, a tendência natural e imediata será o repasse desse custo no preço do arrendamento. É fortemente recomendado que contratos vigentes e de longo prazo sejam reavaliados para evitar atritos.


Aumento de burocracia


Para o proprietário que não for isento, a complexidade administrativa aumentará drasticamente. Ele precisará:


  • Fazer um cadastro como contribuinte do IBS/CBS;

  • Emitir um documento fiscal para a operação;

  • Apurar e recolher o imposto mensalmente;

  • Entregar novas declarações fiscais periódicas.


O arrendador, que antes só se preocupava com o Carnê-Leão/IRPF, entrará na lógica de uma empresa, provavelmente precisando contratar um contador.


Pagamento em produto


Essa prática antiga se tornará muito complicada. Ao receber o pagamento em grãos, o proprietário terá que pagar 7,95% de IBS/CBS em dinheiro sobre o valor de mercado do produto. Ao vender esses grãos, a operação será tributada novamente, mas ele terá um crédito para neutralizar este segundo imposto.


Embora não haja dupla tributação efetiva, a alta carga administrativa e o impacto no fluxo de caixa (pagar imposto antes de receber a receita) devem fazer com que os contratos migrem para pagamentos exclusivamente em dinheiro.


Conclusão


A reforma tributária impacta profundamente o arrendamento rural, transformando-o de um "aluguel" em uma operação tributária complexa. Para proprietários e arrendatários, isso significa um novo custo, pressão no fluxo de caixa, mais burocracia e o provável fim do pagamento em produtos.


Diante disso, a adaptação não é uma opção, mas uma necessidade. É hora de fazer contas e se preparar.


Quem planeja, tem futuro! Quem não, tem destino!


Fonte: Migalhas, por Leonardo Amaral.

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